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OPINIÃO

Por Maria Fátima de Sousa 

Ariano Suassuna viveu nos ensinando que um realista-otimista, como se reivindicava, não se deveria deitar em berço esplêndido, ainda que, belo, fosse ver a banda passar.  Do auto de sua compadecida, esse paraibano/pernambucano certamente pediu socorro a seu conterrâneo e irmão de sonhos, Paulo Freire, para, juntos, esclarecerem o sentido das palavras “otimista” e “realista” no contexto educacional. 

Paulo, quando mencionou o termo “otimista”, não pediu auxilio à ciência do dicionário da língua portuguesa. Afinal, lá tudo já estava bem escrito e referendado pelos doutos. Falava inspirado por seus ideais emancipadores do ato de aprender ensinando e, nesse ato, da real necessidade de nos tornarmos otimistas, espécies de realistas inquietantes, teimosos, inconformados.

OPINIÃO

 

Por Maria Fátima de Sousa 

Ariano Suassuna viveu nos ensinando que um realista-otimista, como se reivindicava, não se deveria deitar em berço esplêndido, ainda que, belo, fosse ver a banda passar.  Do auto de sua compadecida, esse paraibano/pernambucano certamente pediu socorro a seu conterrâneo e irmão de sonhos, Paulo Freire, para, juntos, esclarecerem o sentido das palavras “otimista” e “realista” no contexto educacional. 

Paulo, quando mencionou o termo “otimista”, não pediu auxilio à ciência do dicionário da língua portuguesa. Afinal, lá tudo já estava bem escrito e referendado pelos doutos. Falava inspirado por seus ideais emancipadores do ato de aprender ensinando e, nesse ato, da real necessidade de nos tornarmos otimistas, espécies de realistas inquietantes, teimosos, inconformados.

Realistas seremos quando abrirmos as laterais dos nossos olhos para enxergarmos que a revolução tecnológica e informacional não deve ocupar o lugar de um professor educador. Quando compreendermos que, ao reformar currículos por força da lei, perderemos todas as oportunidades de pensar, com nossos estudantes, as reais situações do país e as potencialidades de superação das misérias sociais, éticas e políticas que ainda assolam a nação brasileira. 

Realistas seremos quando os microscópios abrirem suas lentes, alargando o campo de visão na urgente necessidade de integrar os diversos campos do conhecimento oriundos das chamadas ciências duras e leves, sem que as vidrarias, lamínulas, tubos de ensaio, provetas, pipetas – ainda que as de Pasteur – se abalem. Feyerabend há décadas exercitou o otimismo ao afirmar que “a sociedade deveria quebrar o feitiço dessa ciência totalitária”. Acrescento: a ciência só toma sentido, condição e posição se estiver a serviço da paz, da saúde e da vida. E essas têm feições de raça, sexo, orientação sexual, idade, religião, cor de pele e classe social. 

Paulo, você também foi demasiadamente otimista quando tentou explicar, no mundo real, que a educação popular era virtuosamente pesquisa-ação, logo, ciência da vida. Esse lugar lhe foi negado, mesmo quando o mundo descobriu o método de alfabetização do adulto --  a ciência exata no atrevimento de ser humano, diria Ariano em A Inconveniência de Ter Coragem. Nessa travessia, ser realista é não ter as respostas certas para todas as perguntas. Ou todas as perguntas para as respostas provisórias. Se juntarmos as dúvidas, abrirmos as mentes, agregarmos outros saberes e práticas balizados pelos valores do respeito mútuo, da edificação da ética, da solidariedade e da cooperação, seremos otimistas na construção de corredores comuns de aprendizagem. 

Realistas seremos se despertarmos para a urgente e necessária mudança das rotas petrificadas e enraizadas nas formas de ensinar. Se nos deslocarmos das deliciosas zonas de conforto e estabilidade, da alegria banal de saber ler, ano após anos, os mesmos slides, e recriarmos itinerâncias formativas, educativas, pedagógicas, porque a realidade nos convoca a agir. 

Cumpre colocar à mesa a questão da violência física, ética e moral, do feminicídio, da insegurança alimentar, ambiental, das diferentes condições sociais, econômicas, das políticas dos nossos estudantes: não se trata apenas de temas transversos; precisamos entender a complexidade da formação de sujeitos pensantes, profissionais comprometidos com formas outras de conduzir a vida no mundo civilizado. 

Realistas seremos se ensinarmos, sempre aprendendo, que responsabilidades dessa natureza, felizmente, não cabem em disciplinas, em salas fechadas, menos ainda em telas de computadores modernos. Estes, ainda que úteis, não são capazes de entregar sozinhos profissionais competentes e compromissados com a edificação de um país economicamente próspero, socialmente justo, politicamente democrático, ambientalmente sustentável e culturalmente diverso.   

Paulo Freire, pensativo, olhou para Ariano e disse: “Você acertou ao afirmar: ‘O otimista é um tolo. O pessimista, um chato. Bom mesmo é ser um realista esperançoso’”. Por isso, estão aqui, inquietos, Darcy Ribeiro e Anísio Teixeira, reivindicando que se acrescente: professores e educadores, ativem o DNA da Pedagogia da Esperança. O tempo é hoje, antes que a sociedade não nos reconheça, nem tolos, nem chatos. 

 
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